terça-feira, 1 de abril de 2014

Nenhuma saudade nos 50 anos do Golpe Militar

Vladimir Herzog, Assassinado pelo Regime Militar, 1975


História e Memória na Escola: 50 anos do golpe civil-militar no Brasil e o regime ditatorial (1964-1985)
Prof. Rafael Policeno de Souza
“Para que não se esqueça. Para que nunca mais aconteça”. Dom Evaristo Arns

Este ano completa-se 50 anos do golpe civil-militar no Brasil. Do dia 31 de março ao dia 1º de abril de 1964 (não há consenso na historiografia quanto à data específica; importa é que desde o dia 31 de março já se objetivavam as ações golpistas, que se consolidariam no dia 1º de abril), efetivou-se a agressão ao regime democrático constitucional vigente no país e instalou-se, por 21 anos, uma ditadura militar que, desde seu primeiro dia, até o último, foi caracterizada pelo Terror de Estado, com a mais variada lista de violações de direitos, que passavam pelo afastamento de profissionais de seus postos de trabalho (inclusive professores), cassação de direitos políticos, prisões clandestinas, sequestros e desaparecimentos, execuções, bem como toda sorte de violência física, como a tortura (com ampla lista de procedimentos). Este regime levou à morte e causou tragédias coletivas e dramas psicológicos em um grande número de brasileiros. Sob a Doutrina de Segurança Nacional, com a Guerra Fria[1] como “pano de fundo”, e o aparato ideológico da direita conservadora, o Brasil foi um dos primeiros Estados nacionais a violentar a democracia e implantar uma Ditadura de Segurança Nacional[2]. Além disso, pesa contra a nossa história o protagonismo na implantação do “terror para além das nossas fronteiras”, uma vez ter sido o Brasil um dos principais países que organizou e colocou em prática a Operação Condor, responsável por uma rede de repressão nos países da América do Sul.
Nossa ainda jovem democracia enfrenta inúmeros problemas e limites, que possuem estreita ligação com o período ditatorial recente. É papel da escola contribuir para a compreensão da nossa sociedade, bem como promover espaços de construção de conhecimento que permitam que sejam maximizadas as principais questões, que envolvem a construção de uma nação soberana, que possua cidadãos aptos a interpretar a sua própria história. Para isso, é necessário aproveitar momentos únicos como os 50 anos do golpe e início da ditadura brasileira, e combatermos a nossa trágica “escolha” pela amnésia coletiva, que parece manter boa parte do povo brasileiro“anestesiada” pela não reflexão crítica de seu passado recente. Não questionar e não pensar como e de que forma o Estado brasileiro colocou seu povo sob a tirania e terror por intermináveis 21 anos, nos leva a um perigoso cenário de “naturalização” das violências contra uma democracia ainda em fase inicial de desenvolvimento. Infelizmente o Brasil também foi o último a se redemocratizar, além de até hoje não ter feito avanços significativos na direção da abertura de arquivos, reconstrução da memória coletiva e julgamento dos responsáveis pelo terror de Estado (países como Uruguai, Argentina e Chile já fazem isso inclusive com ex-presidentes e generais julgados e presos). Muitos desses limites estão relacionados à não massificação da discussão ampla e crítica nas salas de aula do Brasil como um todo.
Assim como a memória individual, a memória coletiva da sociedade é seletiva, ou seja, de acordo com a correlação de forças[3] existente escolhe de que forma e em que intensidade “lembrar” de determinado tema. Este item é demasiado complexo para se trabalhar aqui, apenas o inseri a título de ilustração objetiva, em relação ao poder hegemônico exercido pelos grandes conglomerados midiáticos atualmente. A grande e esmagadora maioria foi cúmplice[4] e sustentou ideologicamente o golpe e o regime militar. Hoje fazem editoriais defendendo a democracia, mas são “filhos” de um regime ditatorial. Não é por acaso que não vemos uma grande divulgação dos 50 anos, e quando vemos é a partir da ótica que interessa a sua própria perspectiva, pois sabem estar com as “mãos sujas de sangue”. Colocar o processo histórico que engendrou a Ditadura Militar brasileira em perspectiva, é nosso dever mais urgente, para defesa e consolidação dos valores humanistas que a escola tem o dever de fomentar.

Notas de rodapé
[1] O mundo bipolar, dividido em orientações distintas das potências hegemônicas EUA x URSS. Os militares e a direita civil utilizaram o discurso de que o então presidente João Goulart iria instaurar uma república sindicalista no Brasil e um posterior comunismo. Assim, argumentam que em defesa da soberania nacional e contra a intervenção estrangeira deram o Golpe. Em realidade, documentos liberados recentemente pelo departamento de Estado dos EUA revelam que na verdade os militares é que atuavam contra a soberania nacional e a serviço dos interesses dos EUA na região, contando inclusive com aparato militar caso necessário. Ver “Operação Brother Sam”.
[2] Na verdade, o ciclo de ditaduras na América Latina, da segunda metade do século 20, foi iniciado no Paraguai com a sanguinária direção do general Stroessner, que vergonhosamente se exilou no Brasil e morreu tranquilamente sem o julgamento de suas atrocidades.
[3] Monopolização dos grandes meios de comunicação, concentração de renda e educação deficitária são alguns dos elementos.
[4] A própria rede Globo nasceu da “placenta” da ditadura e se sustentou a partir de sua defesa.


ALGUNS MOTIVOS PARA NÃO SENTIRMOS SAUDADES DA DITADURA MILITAR (1964-1985)

C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento
(Crônica publicada originalmente em 05/04/2012, 2ª edição em 04/04/2013, 3ª revisão 01/04/2014)


Há 50 anos, na madrugada de 31/03 para 1° de abril de 1964, o Exército derrubou o Presidente João Goulart (1919-1976) e passou a ditar as regras no Brasil. Apoiado por empresários nacionais e estrangeiros, pela Igreja, por setores da classe média, fazendeiros e pelo governo dos EUA, o Golpe Militar foi uma reação das elites contra as então crescentes reivindicações sociais de sindicatos, agricultores, partidos de Esquerda, estudantes, intelectuais e artistas. Essas lutas populares eram em prol das REFORMAS de BASE (reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional e política). O pessoal da Direita, que deu o Golpe Militar, temia que ocorresse no país uma Revolução Comunista, como na Cuba de Fidel Castro e “Che” Guevara em 1959. Sendo assim:

1) É verdade que havia mais segurança nas ruas durante a Ditadura? Não! Durante a Ditadura, a repressão policial se concentrou contra grupos políticos de Esquerda (guerrilheiros, estudantes, líderes sindicais, intelectuais, artistas críticos). Se as ruas eram mais pacatas é porque os centros urbanos brasileiros eram bem menores e muita gente (cerca de 60% da população) vivia no campo. Em 1970, por exemplo, Gravataí tinha menos de 70 mil habitantes. Em 2000, tinha 270 mil habitantes!

2) As favelas e o êxodo rural têm a ver com a Ditadura então? Tudo a ver! Entre 1967 e 1979 os militares incentivaram a vinda de muitas empresas estrangeiras para o Brasil, sobretudo empresas norteamericanas. O país se industrializou de vez. Porém, o campo continuou dominado pelo latifúndio, ou seja, muita terra na mão de poucos fazendeiros e pouca terra na mão de muitos agricultores. Resultado disto? Milhões de camponeses sem-terra abandonaram o campo, ocupando as periferias das cidades atrás de emprego nas fábricas. Alguns conseguiram... Outros, não!

3) Não existiam drogas durante a Ditadura? Foi exatamente durante a Ditadura que o campo, no Brasil, se industrializou também, a partir de 1972. Máquinas agrícolas substituíram a mão-de-obra de milhões de agricultores e isso ocasionou ainda mais êxodo rural. Nesse embalo, fazendeiros, empresas multinacionais de agrotóxicos e equipamentos agrícolas investiram pesado na produção de alimentos, mas também, de entorpecentes (tudo em nome do lucro, claro!) em um processo simultâneo em quase toda a América Latina. Rapidamente, as drogas inundaram as cidades...

4) Não havia corrupção na Ditadura? Enormes obras de infraestrutura (estradas, pontes, hidrelétricas, aeroportos) aconteceram no Regime Militar, quase todas superfaturadas e com muitos desvios. Veja o caso da Rodovia Transamazônica, caríssima e até hoje inacabada. Ou mesmo a enorme dívida externa, contraída pelo Governo Militar para industrializar o país. Poucas denúncias apareciam na TV, pois o próprio governo censurava a imprensa, e porque também grande parte da imprensa apoiava o Regime Militar (a Rede Globo, a Folha de SP, o SBT...)

5) Mas a Globo não foi censurada também? Algumas novelas da Globo foram censuradas, mas quase todas por cenas de sexo, beijos e nádegas, não por ideias políticas como foram censurados dezenas de compositores, escritores e professores. Mesmo assim, foi a Ditadura que patrocinou dezenas de filmes estilo PORNOCHANCHADA, via Embrafilme, aqueles filmes brasileiros de comédia-erótica que fizeram muito sucesso no país nos anos 1970.

6) A Ditadura no Brasil foi menos violenta que as Ditaduras no Uruguai, Paraguai, Argentina, Bolívia, Chile? Não! Ainda hoje centenas de pessoas estão desaparecidas por terem sido torturadas e mortas por órgãos militares e policiais: outras milhares morreram assassinadas. Atualmente, a resistência ainda é grande entre os militares e políticos de Direita que, por vezes, contestam a Comissão Nacional da Verdade, instituída pelo governo Dilma Roussef em Maio de 2012 e que busca apurar os crimes de torturadores e terroristas do Regime Militar, resgatando e preservando também documentos históricos do Regime. Muitos desses torturadores seguem hoje recebendo salários, homenagens e mantêm títulos militares. Mesmo a Lei da Anistia Geral, de 1979, promoveu a impunidade dos torturadores e não prescreveu, como deveria, em 2009.

7) Alguém votava na Ditadura? Na maior parte da Ditadura, não! Os militares liberaram o voto em certos momentos, mas apenas para os alfabetizados (milhões de brasileiros eram analfabetos então) e para algumas prefeituras e Estados. Nada de voto para presidente! A lógica era: o povo brasileiro é incompetente, incapaz de votar por ser ignorante. Ou seja, novela (ou pornochanchada), futebol e cerveja pro povo, pois assim o povo deixava que os Generais, os “técnicos” do Exército e das empresas governassem o país.

RESUMINDO: Grande parte dos problemas do Brasil de hoje tem sua origem nos 21 anos de Ditadura Militar!!!!

domingo, 30 de março de 2014

Por enquanto: 100 postagens

Luh Moraes, Olhos de Medusa, 2014



Por Enquanto I

Por enquanto,
não sei se te chamo pelo sobrenome: que diz de onde veio, mas não pra onde vai;
pelo teu segundo nome: que sucede o primeiro, e que tu não gostas, pois foi ideia da tua mãe em homenagem ao teu pai;
ou até por aquele apelido que outro alguém inventou
e que eu gostaria de ter inventado
antes.
Mesmo assim, vou te chamando: 
por enquanto.
(C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento)


Por Enquanto II

Por quanto devo esperar
Esse “por enquanto” passar?
Na verdade não devo.
Mas por enquanto, espero.
(Nátali S., aquela que diz que o Vento suplica por poesia)


Por Enquanto III

Por enquanto, a gente só tenta: sem deixa, nem queixa;
com o tempo a gente monta um jeito, uma rota.
Por enquanto, a gente observa: o espaço, as nebulosas; se acabar o tempo, a gente pausa.
(Mari G., Windy Mary Ann)


Enquanto por... I

Enquanto por ali cem soldados se armam para a guerra
Aqui, de olhos arregalados, eu pareço a Lua e sua irmã gêmea, que voam altas
Em todo canto há um músico que troca as arrebentadas cordas de seu violão.

Enquanto por lá o piquete fecha uma fábrica
Aqui ela olha pro teto e enxerga o forro da casa de alvenaria e lembra da casa quando não tinha forro e ela, pequenininha, não trazia amores no peito e assim conseguia dormir
Em toda rua, avenida, bandeiras conduzem gentes: formigueiro de ideologias.

Por enquanto, o mundo ali fora segue mundando: como que na corda bamba de um circo em que a corporação dos palhaços disputa com o solitário domador de leões a gerência da empresa
Aqui, nem ela, nem ele, ouvirão som algum que não seja a voz um do outro.
Não dormem, embora devam... Queiram
Por enquanto, em qualquer lugar, um padre cansado badala o sino das três da tarde junto com o das três da manhã.
(C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento)


Questionário da vida

Imaginar Reimaginar
Pensar Repensar
Criar Recriar
Fazer Refazer

Fazer? Por que eu?
Imaginar? De que adianta?
Criar? Por que não esperamos eles fazerem?
Pensar? Para quê?

Perguntas simples
Respostas rápidas
Muitos opinam
Poucos perguntam.
(Juliano Maciel Vargas, estudante do 9º Ano da EMEF Alberto Pasqualini, Gravataí/RS)


Goofy Blues -10 anos de Rock n´Roll em Gravataí: Não apenas o CoV está em festa com suas 100 postagens, mas a banda Goofy Blues celebra no mês de Maio dez anos de estrada!!!! Parabéns e long live rock n´roll!!!


Goofy Blues  Depois (Nossa história):


         A Goofy Blues é contemporânea da maior banda da galáxia: a MADAME SATÃ, banda em que este Inventor do Vento começou sua carreira de cantor e compositor.

Leia mais sobre a MADAME SATÃ na postagem do dia 20.07.2013

E ouça aqui:

sexta-feira, 21 de março de 2014

A Menininha Ventosa e o Esqueleto

leonaM, O Esqueleto, Março de 2014

O Esqueleto

(C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento)

O Esqueleto subiu no palco
e começou a bailar
Não agradou lá muito a platéia
pois sua bunda era pouco carnuda

O Esqueleto foi a uma festa
Botou seu traje de luto
Pois, você sabe, roupa de gala,
para o Esqueleto, é paletó de defunto!

O Esqueleto foi bater raio-X
Ofereceram cafezinho, ele não quis
Sabe ele muito bem, que o café faz mal pro coração
Sim, sim, hoje em dia não é mais o Amor, não!

O Esqueleto sentiu-se tão sozinho
Comprou um cachorro e encheu de carinho
Um dia pegou no sono, o cachorro esqueceu quem era o seu dono
Enterrou-o no jardim
Pobre esqueleto, enfim!

Quando vivia só, vivia em paz
Mas veja o que uma má companhia faz!

CoV  A Menininha Ventosa e o Esqueleto  (2014): 

CoV  O Esqueleto  (2012): 


CoV  O Esqueleto  (2013): Ao vivo no Estúdio LACOS Bar, Cachoeirinha/RS, em 14.12 de 2013, no lançamento do CD "Cavalgando o Vento". Registro amador do Ventoso amigo Francisco Castro.







sexta-feira, 14 de março de 2014

OBSECO MC

Emile Bernard, A colheita do trigo, 1888

O vento brisa o pensamento
(OBSECO MC)

Por quê?
Será que sou inocente demais?
Ao ponto de ser visto não um homem
E sim um rapaz
O tanto que eu fiz o tanto que eu faço
Em meio a tantas lamentações
Eu só me embaraço e pergunto
Todos os dias
Será que ser honesto, correto
Faz de mim um cara tão incorreto?
Minhas forças estão a se esgotar, mas desistir é inútil
Às vezes, os buracos são tão profundos que me tampam até a cabeça
Passam dias, semanas, até que eu esqueça
O tempo passa e nunca volta
Quanto mais só eu sou mais só eu fico
Uma aproximação, meia-dúzia de palavras
E uma decepção
Tantas palavras foram ditas
Mas alguma fez efeito?
Fez?
Não sei
Só sei que isso tudo
Tá sendo uma loucura
Onde nem as pronúncias têm o efeito de parecer uma denúncia
Se for parar pra pensar eu já me acho um espinho
Onde as rosas, ao meu redor, morrem
E novamente eu volto a ser sozinho
O vento leva as folhas
E o pensamento cobra

Erradas escolhas 


quinta-feira, 6 de março de 2014

Me alugo para sonhar

Kasimir Malévitch, Três Meninas, 1928 a 1932


Me alugo para sonhar
(Um dos “12 Contos Peregrinos”, 1992, de Gabriel García Márquez, 1928)


1.     “Eu me alugo para sonhar”.
Na realidade, era seu único ofício.
Havia sido a 3ª dos 11 filhos de um próspero comerciante da antiga Caldas, e desde que aprendeu a falar instalou na casa o bom costume de contar os sonhos em jejum, que é a hora em que se conservam mais puras suas virtudes premonitórias”.
(Sobre a mulher que tinha sonhos premonitórios)

2.  Movia-se através das pessoas como um elefante inválido, com um interesse infantil pelo mecanismo interno de cada coisa, pois o mundo parecia, com ele, um imenso brinquedo de corda com o qual se inventava a vida.
(Sobre o poeta Pablo Neruda, 1904 a 1973)

3.     Não se impressionou, porém, pois sempre havia pensado que seus sonhos não eram nada além de uma artimanha para viver. E disse isso a ela.
(Neruda sobre a mulher que previa o futuro)

4.    “Sonhei com essa mulher que sonha”.
(Outra vez o poeta Neruda sobre a moça dos sonhos)

5.     “Sonhei que ele estava sonhando comigo – disse, e minha cara de assombro a espantou. – O que você quer? Às vezes, entre tantos sonhos, infiltra-se algum que não tem nada a ver com a vida real”.
(Disse a mulher sobre o poeta)

6.      – Em termos concretos – perguntei, no fim -, o que ela fazia?
- Nada – respondeu ele, com certo desencanto. – Sonhava.
(Perguntou Gabriel ao embaixador de Portugal em Cuba).


Maria RitaA Festa  (2012): Esta vai pra Rita, que ouviu, digo, leu o Vento quando seu sopro já estava virando Marolinha.