John Everett Millais, A Enchente, 1870
Ventos de Páscoa
(C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento)
Que os teus hebreus estejam
libertos do cativeiro egípcio
Que o teu Cristo tenha
renascido outra vez e de novo –
a despeito de todas as Cruzes
do mundo;
Que os pagãos ponham o arado
na terra, pois é tempo de plantar
E que façam uso de suas
foices, já que também pode ser tempo de colher:
Isto só depende da lavoura de
cada um;
Que as tuas crianças demorem a
limpar os beiços lambuzados do chocolate
(tão cheio de surpresas quanto
o restante da vida)
E que o Coelho lhes cobre, em
troca, apenas um sorriso de outono.
Hagadá ou a narrativa da Pessach – A Páscoa judaica
E quando
Moisés chegou ao deserto olhou para o povo hebreu pensando “após séculos de
cativeiro no Egito viveremos 40 anos livres, ainda que perdidos, nas areias do
Sinai e isso até Canaã nos escravizar novamente com sua promessa de liberdade”.
(C. A.
Albani da Silva, o Inventor do Vento)
Moisés, o
que gaguejava
(C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento)
O rei do
grande Egito
Após o grande
banquete
Mandou os
servos de ombros caídos:
“Tragam
O meu miúdo netinho”
Upa! Upa!
Neguinho
Agu-dadá
E toda a grande
corte do faraó poderoso
No
suntuoso palácio enfaraoado
Disse que
entre avô e bebê via-se a cara de um
O focinho
do outro
Assim como
os pingos da chuva no Nilo
Se
parecem uns aos outros
Ainda que
a verdade das fuças reais
Ao
contrário das chuvas do rio
Estivesse
bem longe disso
Três anos
antes
O grande
rei faraó mandara grandiosamente
Matar
afogado
A todo piquitito
menino bebê
Nascido
entre os insignificantes
Escravos
hebreus
Assim um
mago conselheiro lhe aconselhara
Após um
pesadelo tinhoso de estranho que
O rei
tivera e não lhe saía da cabeça:
Pudera!
Veja como o susto monárquico foi grande:
Quando
posto na balança do sonho
O Egito
antigo inteirinho da silva
Era mais
leve que um franzino cordeiro
Israelense
E esse
filho de Israel peitaria o Império
Depois de
crescido em bigodes, calças e idéias
Libertando
os escravos hebraicos
Naquele ano
de crianças sem vida
E mamães
sem consolo
Na beira
dos rios, tanques e poços
Uma mãezinha
sorriu de faceira:
E foi
justo a filha do faraó rei: A princesa
Como muitas
outras mulheres ela rezou,
Em dias
tão brabos
Mas só
essa moça é que foi atendida
Com tanta
criança sendo jogada fora por aí
Que
uminha lhe caísse com vida em mãos
E o
pequeno Moisés foi assim retirado das águas!
O
conselheiro afogador de pimpolhos
Nunca
engoliu esse copo mosaico, não senhor
Dede cedo
reparou que
O
brinquedo favorito do garoto
Era a
coroa encravada de ouro
Olho de
Hórus
Do velho
avô rei
E este,
poderoso, malvado, mas tanso faraó
Ria bem
alto - toda a corte ria junto, medrosa que só
E bajuladora
deveras
Durante o
bilboquê de seu neto travesso
“Matem esse guri agora
Nada é por nada: Tudo significa alguma coisa
Não se brinca com a coroa de um rei
Exceto quando se nasce pra reinar
Esse moleque é filho de escravos
E será o líder deles na revolução que
Jogará nosso ancestral império
Na lata de lixo da história”.
Foi um
alvoroço naquele nobre salão
Desacostumado
a polêmicas
Já que ali
todos se dispunham
A cantar
no coro dos contentes
Para não
perderem seus cargos
O
conselheiro foi mais longe ainda
Buscou um
pote de ouro
Outro pote
cheio de brasas queimando, saídas da lareira
Desafiando
a todos e disposto a comprovar
A
esperteza do garoto inimigo da pátria
Comentou
“Reparem que o monstrinho
Agarrará as jóias raras e as moedas caras”
E assim Moisés
o faria
Com os
braços roliços de bebezão saudável
Sabedor
dos perigos do fogo
Conhecedor
das fortunas do dinheiro
Se não
fosse um desses anjos do céu
Antenado
em questões políticas que lhe
Colocou
Num passe
de mágica
Umas
brasas na boca
A criança
engasgou, cuspiu, chorou e queimou a língua todinha
Ninguém mais
desconfiou de rebelião alguma
Era só
uma criança indefesa, ora bolas!
E sentiram
muita peninha do nenê ultrajado
Até o rei
demitiu o mago paranóico na mesma hora
A
princesa, bem chateada, ouviu da boca do médico
Da corte
“Nessa brincadeira
Moisés ganhou uma gagueira danada
Pro resto da vida”
Anos mais
tarde
Um
historiador anotaria também:
“E gaguejando
Com a fala travada de sua língua pesada
Moisés tocaria o velho povo judeu
Pelos caminhos da nova liberdade
Nas areias do Sinai
Nas águas do Mar Vermelho que
Ele também fez levitar
Atrás de Canaã
Lugar pra se dizer lar
Até o aparecimento
De algum outro império
Metido a dono do mundo”.
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