quinta-feira, 1 de maio de 2014

Simplício, Salviati e Sagredo conversam

Lunações, Galileu Galilei, século XVII


 Giovanni Francesco Sagredo fala da vida do universo e o homem:

            Não posso, sem grande admiração, e direi mesmo, grande repugnância no meu intelecto, ouvir atribuir como grande nobreza e perfeição aos corpos naturais e integrantes do universo, esse ser impassível, imutável, inalterável, etc., e inversamente considerar grande imperfeição o ser alterável, gerável, mutável, etc. Quando a mim, considero a Terra nobilíssima e admirável pelas tão numerosas e diversas alterações, mutações, gerações, etc., que nela incessantemente se fazem, e se acaso, sem estar sujeita a qualquer mudança, ela fosse toda uma vasta solidão de areia, ou uma massa de jaspe, ou se no tempo do Dilúvio, gelando-se as águas que a cobriam, tivesse permanecido um imenso globo de cristal, onde nunca nascesse ou se alterasse ou mudasse alguma coisa, eu considerá-la-ia então um corpo inútil no Mundo, cheio de inércia e, em resumo, supérfluo e como se não existisse na natureza; e faria aquela mesma diferença que há entre o animal vivo e o morto; e o mesmo digo da Lua, de Júpiter e de todos os outros globos mundanos. Mas quanto mais me embrenho em considerar a estultícia dos discursos populares, tanto mais levianos e estultos os acho: e que maior tolice se pode imaginar que aquela que chama coisas preciosas às jóias, à prata e ao ouro, e coisas vis à terra e ao lodo? E como é que não ocorre a esses tais que se houvesse tanta escassez de terra como a que há de jóias ou de metais mais preciosos, não haveria príncipe algum que de bom grado não despendesse uma soma de diamantes e de rubis, e quatro quilates de outro, para ter apenas a terra necessária para plantar num pequeno vaso um pequeno jasmim, ou semear lá uma laranjeira da China, para vê-la nascer, crescer e produzir tão belas folhas, flores tão odoríferas e tão aprazível fruto? É portanto a penúria e a abundância que dão maior ou menor valor às coisas junto do vulgo, o qual dirá depois ser aquele um belíssimo diamante, porque se assemelha à água pura, e depois não o trocaria por dez pipas de água. Esses que tanto exaltam a incorruptibilidade, a inalterabilidade, etc., creio que se limitem a dizer essas coisas pelo grande desejo de viver longamente e pelo terror que têm da morte; e não consideram que se os homens fossem imortais, eles não teriam vindo ao Mundo. Esses mereceriam topar casualmente com uma cabeça de Medusa, que os transformasse em estátuas de jaspe ou de diamante, para se tornarem mais perfeitos do que são.

(Galileu Galilei publicou os “Diálogos sobre os dois máximos sistemas de mundo – Ptolomaico e Copernicano” em 1632 a pedidos do papa Urbano VIII...)


CoV  Quando o Vento sorri : No Dia do Trabalhador foi o Vento que sorriu no Sul do Brasil...

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