quinta-feira, 27 de junho de 2019

MAKINANDO o MAKINÉ



A HORA e a VEZ de GUIMARÃES ROSA

Acordei com a matraca na frente de casa embarulhando tudo. E não era vendedor de casquinha. Foi a hora e a vez do nhô Augusto Matraga que se achegou para ouvir a minha nova composição: MAKINANDO o MAKINÉ, escrita no janeiro de 2019. Estive nas cascatas do Garapiá e da Forqueta naquele verão. Ou em uma das duas, sei mais não. Nem me alembro em qual. Nessa impossibilidade de viajar até Cordisburgo, no sertão das Minas Gerais, e conhecer, em pessoa, com os olhos da cara, a Gruta do Maquiné que tem lá, me contentei em ver a água cair nas grutas furadas de goteiras (que é o significado de MAKINÉ em tupi-guarani) aqui mesmo no grande Rio Grande do Sul.

Augusto Matraga veio ouvir minha composição, gravada com viola caipira, contrabaixo, pandeiro e criatividade no Laboratório de Sons do Vento, conforme segue abaixo o áudio (ou acima, só depende do ponto de vista do leitor) a mando de um Bruxo chamado JOÃO GUIMARÃES ROSA (1908-1967).

Em 1930, num jornal carioca simplesmente O JORNAL, Guimarães floresceu uma mirabolante história de heróis, espadas e magia. Um grupo de aventureiros FENÍCIOS, com seus barcos a remo, forrados de escravos caldeus, egípcios e israelitas, chegou ao Brasil nos Antigamentes da Antiguidade para brigar com os índios TUPINAMBÁS locais que protegiam as riquezas e tesouros de uma gruta encantada do Maquiné. Eu é que fiquei encantado com esse conto maluco e compus então a nova canção ventosa: MAKINANDO o MAKINÉ.

Compartilho a canção e essa leitura rosiana em meio às FESTAS JUNINAS que, enquanto acendem às suas fogueias para espantar o frio do inverno em suas longas noites, celebram também a vida rural brasileira com seus santos bíblicos (São João Batista – em 24/06, São Pedro Apóstolo – em 29/06) e seus santos medievais (Santo Antônio de Lisboa – em 13/06) trazidos nos barcos não os dos fenícios, mas pelos barcos da fúria religiosa e da ganância capitalista dos colonizadores europeus de 1500.

João Rosa foi, na opinião do fazendeiro Nhô Augusto Matraga que, antes de me visitar, renunciou ao seu poder de ter terras, gados e gentes após sofrer algumas humilhações na vida (depois de tanto humilhar os outros, porém), dizia eu que o Matraga me disse que o maior autor brasileiro a fazer a ficção da vida rurar nos sertões do país foi o Rosa João esse.

Estudioso das línguas do mundo (Rosa lia e falava umas 10, entre as línguas derivadas do latim romano até as línguas germânicas e eslavas da Europa). Além disso, ele fez bruxaria com a fala e o cantar caipira dos caboclos do rio Urucuia, região sertaneja onde Rosa nasceu. O cara era autêntico gostador de inventar palavras e verdadeiro apanhador de nomes pelo mundo.

Formado em médico, filho do dono do armazém local, que era chamado Seu Fulô que era casado com Sua Chiquitinha, Rosa exerceu a profissão de curador de doenças por uns quatro anos, no lombo do seu cavalo pelo sertão campo geral. Anos poucos mas suficientes para aprender o aprendido que expressou em seus livros sobre o sertão.

Bateu perna pelo cosmos global como diplomata em Hamburgo na Alemanha, em Paris na França e em Bogotá na Colômbia. Foi secretário de um dos políticos mais poderosos da Era Getúlio Vargas, o ministro gaúcho criado a leite de vacas da Cachoeira do Sul: JOÃO NEVES da FONTOURA (1887-1963). Aliás, o discurso de posse de Guimarães Rosa na Academia Brasileira de Letras é um fascinante texto em homenagem ao falecido amigo. Tão denso, íntimo, biográfico e poético, que, três dias depois, o imortal João Rosa morreu também.

João Rosa, além do conto MAKINÉ, escreveu um ousado (mas menosprezado) livro de poemas em 1936. O livro se chamou MAGMA e os originais foram premiados em concurso literário, mas sendo lançado só postumamente, por desdém, em vida, do autor. Lá se encontram um arco-íris de poemas (chamados VERMELHO, ALARANJADO, AMARELO, VERDE, AZUL, ANIL e ROXO).Talvez porque esses poemas levantem suspeitas de ambiguidade sexual nos machos machões de plantão como quando o jagunço RIOBALDO, em pleno sertão sertanejo, se apaixonou por outro pistola pistoleiro, o DIADORIM, em GRANDE SERTÃO: VEREDAS (1956).

Porém, todo mundo considera seu primeiro grande livro o SAGARANA de 1946. Depois o clássico CORPO de BAILE (1956) e o resto não é resto é quase Prêmio Nobel (só não foi porque Guimarães Rosa se foi assim num piscar de olhos e do nada).

A terra natal de Rosa, o arraial de Cordisburgo, era lugar de passagem de muitos boiadeiros que tangem o boi enquanto gemem ABOIOS. E o boteco do pai era um centro de reunião de muitos contadores de causos e cantadores acompanhados de viola. O próprio João Rosa subiu no lombo do pangaré e, em 1952, acompanhou os vaqueiros da fazenda de um primo, desde as margens do rio São Francisco até o sertão profundo.

Assim como, dois vaqueiros e contadores de histórias famosos da sua cidade foram parar em seus livros: MANUELZÃO e JOCA BANANEIRA.

Em 1938, João Rosa saiu do Brasil para diplomatar. Entretido com os negócios da diplomacia internacional, ele precisava se vestir de aristocracia com terno, gravata, inté cartola. Aderiu à gravata borboleta porque assim não precisava dar nó. Boa maneira que João Rosa inventou para desatar os nós da vida: não atá-los.

Como um estudioso escreveu: os personagens de Rosa formam suas personalidades quando se confrontam ou são acuados pelo AMOR, pela DOENÇA, pela MORTE, por VINGANÇA. Acho que foi isso que Paulo Rónai escreveu num prefácio para a editora José Olympio. Se não foi, corra atrás e leia com seus próprios olhos, menina.

Ah! E como a ordem e a desordem andam sempre do mesmo lado, Nhô Augusto Matraga veio me acordar matraqueando e acompanhado do assassino profissional Joãozinho Bem-Bem. Mostrou suas armas, o Joãozinho. Não tive medo. Só tive pena. Mas ele não me fez mal. Ouviu a nossa conversa e a tudo calado, pensando em suas vinganças sanguinolentas, creio eu.

Ou pensava que João Rosa fazia aniversário em 27/06, vai saber. Mais um canceriano sob o signo da constelação do Caranguejo era esse João Guimarães Rosa, o Bruxo sertanejo.
Vuuuush
(c. a. albani da silva, o inventor do vento)


MAKINANDO o MAKINÉ
(c. a. albani da silva, o inventor do vento)

*Para João Guimarães Rosa, 1908 a 1967

Ele sabe bem o que quer:
Com a cabeça em Makiné
Na cobiça dos verdes diamantes
Dos vermelhos tupinambás
Sua galera do oriente fenício
Remou e alcançou o além-mar

Ele sabe bem o que quer:
Com a cabeça em Makiné
É a história de Kartpheq, o feiticeiro
Rabiscada em papiro brejeiro
Que o João Rosa canta
Conto de israelitas, egípcios, escravos caldeus
Adoradores do deus Baal-Jeová

Ele sabe bem o que quer:
Com a cabeça em Makiné
O velho escriba com sangue inocente
Escreveu um desejo indecente
De só ganhar e ganhar
Mas havia outros vícios tinhosos
No calor dos tristes trópicos antes do português chegar

É a fé é que move as montanhas
E o dinheiro as compra e vende
Só o amor derruba as cavernas
Das pedras de Sumé
Dentro do peito da gente

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