AUDIÇÕES
de FÉRIAS 4
ALFREDO
ZITARROSA
Os
EUA ficam muito longe, meus amigos de leitura, de som e de viagem.
Por isso eu prefiro o Uruguay. O Uruguay do cantador ALFREDO
ZITARROSA.
Nascido
em 1936, filho de uma bailarina, mas criado até os 15 anos pelos
tios. O pai biológico nunca lhe reconheceu como filho.
Alfredo
Zitarrosa trabalhou por dez anos como jornalista e locutor de rádio,
até uma viagem ao Peru, sem um centavo no bolso, quando uns amigos
fizeram o cara cantar pra pagar as contas. Era 1964, e desde aquele
momento, o vozeirão e a poesia de Zita não deixaram mais de soar
por toda a América Latina.
Em
1966 estreou com o álbum CANTA ZITARROSA, álbum que vendeu parelho
aos discos dos Beatles, a maior banda da história, e que chegavam ao
Uruguay na mesma época. Em 1989, lançava o último álbum: SOBRE
PÁJAROS Y ALMAS, ao lado de um jovem cantador, Numa Moraes,
sublimando a ideia de passar seu legado adiante como poeta através
da canção popular.
Zita
considerava a milonga como madre (mãe), desde o campo, desde a
pampa, de todos os outros ritmos musicais da região platina. Ou
seja, o candombe negro, a chamarrita, a chacarera, o zamba.
Viveu
08 anos exilado, portanto, longe de sua terra natal, como Dante na
Itália do século XIV, como Da Vinci na mesma Itália no século
XVI, longe de casa. Enfim, o Uruguay também viveu o drama de gorilas
endinheirados e fardados que se acham donos da terra, da água, do
ar, do fogo e da fé e que governaram através de golpes e ditaduras
militares. Assim, ele passou pela Argentina, Espanha e México,
desterrado. Quando voltou, em 1984, foi acolhido por uma multidão,
que lotou as ruas de Montevidéu e as suas Ramblas (calçadões) no
Rio da Prata, para ouvir seu vozeirão de novo.
Em
1989, Zita faleceu. Não sem antes deixar uma biblioteca de mais de
2000 livros, quase todos lidos e rabiscados pelo artista. Também
fundou uma casa noturna chamada CLARABOYA AMARILLA, nos anos 1970,
onde a arte e o artista tinham prioridade e não o lucro.
Conta-se
que uma vez, contratado para um show de 07 músicas, na hora de subir
no palco o contratante lhe disse que havia tido um problema e o cachê
seria pela metade. Sem demora, Zita subiu ao palco, cantou, mas
exatamente no meio da terceira canção ele parou, explicou a redução
do pagamento ao público e convidou a todos para terminarem o recital
no bar da esquina, cantando as 3,5 canções que faltavam, e tocando
todas mais que eles quisessem ouvir.
Doña
Soledad (1968) é um de seus temas que eu mais curto:
DONA
SOLIDÃO
(Alfredo
Zitarrosa)
Olhe,
Dona Solidão
Pense
um pouco, Dona Solidão
Quantas
pessoas existem que
Te
conhecem de verdade
Eu
te vi no armazém
Brigando
por uns trocados, Dona Solidão
Os
outros dizem, faça o bem, sem olhar a quem
Quantos
trocados terás
Se
não for pela generosidade, Dona Solidão
Terá
o suficiente para comprar o pão e o vinho
E
nada mais
A
carne e o sangue são propriedades do patrão
Dona
Solidão, quando o Cristo disse não
Sabes
bem o que ele passou
Olha,
Dona Solidão
Eu
te falo demais
Dona
Solidão, e você
Para
falar teria que querer estudar
Certo
de que tenha tentado isso
Mas
não conseguiu, Dona Solidão
Porque
mesmo antes de se tornar mulher
Já
teve que ir trabalhar
Olhe,
Dona Solidão,
Ponha-se
um pouco a pensar
Dona
Solidão, é isso que quer dizer a liberdade
Você
até pode morrer
É
só uma questão de saúde
Mas
não queira saber
Quanto
te custa um caixão
Dona
Solidão, tens que trabalhar
Mas
também tem que pensar
Não
vais morrer
Só
vão te enterrar
Dona
Solidão, tens que trabalhar
Mas
tem que pensar, Dona Solidão.
(Tradução
livre do Inventor do Vento)