terça-feira, 9 de abril de 2019

GRAVATAÍ – entre dois aniversários, uma meia festa, arrumamos as gravatas



GRAVATAÍ – entre dois aniversários, uma meia festa, arrumamos as gravatas

      Nasci, moro e trabalho numa cidade que tem dois aniversários e uma meia festa. Assim, o povoado colonial, chamado Aldeia dos Anjos, no dito pelo não dito dos historiadores, se fala que foi fundado em 08/04 de 1763. Mas foi em 23/10 de 1880 que inventaram o município moderno com nome de rio, Major Bernardo pra lá, Cel. Fonseca pra cá, flores de gravatá no meio dos governamentos ilustres que seguem desde então. Ainda temos, ou melhor, os católicos têm, como eram meus avós, a festa da padroeira: Nossa Senhora dos Anjos em 02/08, padroeira também da Costa Rica na América Central e de Los Angeles, logo ali na Califórnia, EUA, me informam dois demônios que esperam ônibus na parada e gostam de ler sobre geografia e as coisas do céu. A seguir o roteiro do povoado fundado no século XVIII, podemos arrotar entre a gauchada que estamos assim assim entre a meia dúzia de cidades mais veteranas do Rio Grande do Sul! Algo como: Rio Grande (1737), Santo Antônio da Patrulha (1743), Viamão (1747), Triunfo (1754), Porto Alegre dos Casais (1772): ops, a capital surgiu depois de nós! Caceta! Mas isso é polêmico como o sexo dos anjos, ainda por cima morando na terra deles. Então me calo.

           O povoamento colonial é mais ou menos assim: por volta de 08 de abril de 1763 o capitão Antônio Pinto Carneiro chegou ao Vale do Rio Gravataí com cerca de mil e um índios guarani vindos dos Sete Povos das Missões (as cidades barrocas entre São Borja e Santo Ângelo, vocês sabem). Depois das Guerras Guaraníticas (1753-1756) em que o índio Sepé Tiaraju (com seu lunar mágico à testa) se juntou com outros índios missioneiros putos dos cornos e de vários padres jesuítas putos também, mas mantendo o decoro pra não cometerem muitos pecados, botaram bravamente pra cima dos mandos e desmandos do Império de Portugal e da Espanha aqui no Sul do Brasil Colônia. Depois da guerra, perdida, como a maioria das guerras, dizia eu, o Rio das Bromélias (Gravataí) e o Morro Itacolomy (ou do Menino de Pedra) acolheram a essa gentarada cansada de briga. Não demoraria muito e a Aldeia de Nossa Senhora dos Anjos receberia também famílias portuguesas vindas das nove ilhas de Açores, sacolejando heroicamente em naus catarinetas, sete anos e um dia no mar; trabalhadores africanos escravizados desde a Nigéria, Angola e Moçambique – e que aqui ergueram os seus quilombos (do Paredão, logo ali em Taquara; Manuel Barbosa, aqui mesmo, quase em Glorinha) para cultuarem os orixás e a distante Mama África do outro lado do mar Atlântico; muitos portugueses e espanhois aleatórios vieram cafungar aqui, atrás de índias, ouro e terra (se vê, quando acharam uma coisa, não acharam a outra); vários colonos alemães (a partir de 1824 foram branquejar germanices nas redondezas desde São Leopoldo e Novo Hamburgo no vale do Rio dos Sinos); italianos (a partir de 1875 na Serra gaúcha, um pouco em Sto. Antônio também, trazendo seus vinhedos cultivados aos gritedos de galinha com polenta); poloneses na polska Erechim e de lá pro cosmos pampa; japoneses (a partir de 1908 desde São Paulo, meu amor) que vieram se achegando. Para cada manso trabalhador em busca de mansidão, um sem fim de conflitos.

           Digo mais – para desespero dos gloriosos governamentos da Aldeia, foi a Gregória Rita Coelho de Mendonça, bem provável, a 1ª professora pública do RS, alfabetizando os guarani da Aldeia no século XVIII, suas crianças e idosos... Se ainda se usasse lista telefônica, sopra-me o demônio estudioso, no ouvido esquerdo, proveitoso seria eu procurar o número do ilustre carreteiro da Costa, o matadouro de gado do Fonseca, o tambo de leite do Gomes, passear pelo Passo das Canoas com o Pacheco, jogar o jogo do osso com o Maciel, espiar o arrozal do Rosa, e as cochas da filha do Rodrigues, o Sarmento e o Soares contando causo de assombração na botica da Rua de Baixo; entre outros bons momentos com os coroneis da farinha. Talvez embaralhei algum nome aí. Com a boca cheia de mandioca em pó, gargalharia pifado no carteado que eu não sei jogar...

             Deste município nasceram outros – Canoas (1939), Cachoeirinha (1966) e Glorinha (1988). Porém, uma velha amiga marxista (ou seria um demônio?) escreve-me atucanada, me alembrando temerosa de meus preguiçosos esquecimentos, antes que acabe esta croniquinha, que a rural Aldeia dos Anjos virou cidade mesmo somente entre os anos de 1968 e 1982 ao receber um Distrito Industrial. Distrito este sucedido no ano 2000 pela inauguração de uma montadora de automóveis multinacional com seu complexo industrial próprio (e muitas isenções fiscais).

         Nesse processo de modernização econômica surgiram os bairros operários (Moradas do Vale I, II e III; COHAB´S A, B e C), ademais bairros e comunidades suburbanas na periferia da cidade – que é o “povo das paradas” (de ônibus). Igualmente vieram os condomínios fechados e belos residenciais em que se dá oi, chegando ou partindo, a um guarda na portaria, seguramente, dos cumprimentos e dos ladrões. Na real, continuamos uma aldeia, só que agora global!
(C. A. Albani da Silva, o Inventor do Vento)

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