Dedico
a parte 5 do meu livro “OS 140 FILHOS de MÃE NANA”, que eu vou
postando como a um folhetim virtual, a duas pessoas muito queridas
que esta semana me surpreenderam com presentes: a excelente
aluna Cila
Carvalho que
me deu A BORBOLETA AMARELA, do tremendo cronista Rubem Braga, e eu lhe
retribui com o meu livro A MENINA do COLAR e a GIRAFA ELÉTRICA; e a
Professora Taís
WB,
companheira de greves e outras humanidades que me deu o livro de
GUSTAVO BEHR: Bairro Alto, Cidade Baixa. O cara manda ver em sua
guitarra e em sua escrita lá em Lisboa e ainda encontra túneis
entre Portugal e Porto Alegre. Lhes devo presentes ultramarinos
agora. O vício da leitura tem dessas coisas maravilhosas: é uma
bola de neve, ou melhor, de papel. Mas como Mãe Nana é muito
ciumenta, deixo o leitor logo com ela, apresentando mais 05 de seus
filhinhos, antes que ela me encha de cascudos fictícios:
OS
140 FILHOS DE MÃE NANA – parte 5
GONÇALO: Demorarei muito pra escolher o nome deste meu filho. Começarei por Anderson, mas me agradará mais Peterson. Só que este nome, por algum motivo, talvez a sonoridade, não sei, me fará lembrar de Patrício ou Patrick, nomes que eu detestarei. Seu batismo, por essa e por outras, ocorrerá na pia de um banheiro de rodoviária. O escrivão que vai datilografar a sua certidão de nascimento me dirá: “Olha, Sinhá Nana, escolher nome de filho é sempre um problema. Tenho 04, e um quinto está a caminho, e deixo sempre pra minha mulher essa incumbência. Sempre existiu outro alguém antes que fez bom ou mau uso desse nome. E daí pra saber do bem e do mal já é uma trabalheira dos diabos”.
Ficarei com Gonçalo, que é o nome do meu avô mais legal e de um santo português.
MAICON:
Aos 17 anos vai embarcar no porto de Santos, já que o dos Orixás
estará fechado para reformas e o mar o levará ao encontro daquilo
que a terra não lhe pode dar: botas de couro espanhol. Um pé de sua
tão sonhada bota dará a Mãe Nana, o outro pé da bota dará a uma
amante, não sei se na bunda de uma delas ou das duas. Maicon vestirá
o pala de um índio aimará e meias usadas de um índio quéchua que
não sentia frio nos pés; um tigre por inteiro vestirá por dentro.
Na marinha mercante os negócios serão sempre pacíficos no Pacífico
e atlânticos no Atlântico. Por isso lhe direi que os fuzileiros
navais, estes, sim, entram em guerra com merlins, peixes-rei, sereias
e caranguejos. Moreno de quatro ventos nas quatro faces da cara, com
sol e sal lhe temperando o espírito até o naufrágio chegar, este
será o belo Maicon. Partiu somente porque fiz questão de lhe dizer
que os tubarões estavam famintos e chamavam por ele sem mais demora.
SARAH:
Sempre acima do peso, Sarah não se entenderá com as balanças nem
com seu ponto de equilíbrio. Sempre quando contrariada, já adulta,
mãe de menina grande, diplomada na escola da vida e outras
universidades, vai sapatear, chorar e soluçar sempre afirmando que
os seus percalços e problemas é que são dignos de dó. Ouvintes
rirão, incrédulos, ou mais sabidos na própria carne de lambadas e
cagadas realmente grandes; ouvintes terão pena e destinarão lenços
para seu amparo. Veja você mesmo se a sua filha for embora de casa
muito cedo e se isso lhe porá de joelhos, sendo Sarah você. São
poucas as linhas do tempo e do destino, e o novelo de quase todos os
filhos de Nana se enrola e desenrola no tricô dessa manta que teima
em não ficar pronta enquanto sigo parindo e fazendo amor. Bem antes
de achar um homem que preste, vai conversar com orixás e bruxas nas
matas, fantasmas nas casas mal e bem assombradas que lhe ensinarão
que a piedade e a compaixão advirão dos afoitos e inexperientes,
grosso modo. Por falar demais dará com a língua nos dentes e com os
dentes no céu da boca o que provocará mordidas e arranhões em suas
nuvens. Ao fim e ao cabo, deitará com orgulho de si mesma: não
tendo engolido tantos sapos quanto algumas amigas silenciosas e tendo
ajudado a muitas gentes em horas difíceis.
FRANCINE:
O dom de Fran será petrificar os namorados. Alguns dirão que por
efeito de seus olhos verdes de Medusa, outros, mais safados, que pela
bundinha petulante de arrebitada, mas, na verdade, por obra e graça
dessa madrinha de destinos que é a Mãe Nana. Os pretendentes
virarão belas estátuas e nelas os colibris beberão água com
açúcar preparada por Fran, nua ao acordar, antes do banho da
purificação para deixar ainda mais alva a pele na banheira plena de
sais e rosas com desdém.
TAÍS:
No grande e luxuoso Hotel das Dores, Taís limpará a mesa comprida
do salão executivo e nunca sentará à cabeça dela. Enxugará
centenas de pratos por dia, varrerá o chão por gosto, pois o chão
não é lugar de cuspir. Nos arrabaldes do fim do mundo ficará sua
casa, limpa e cheirosa. Enquanto os 05 filhos pedem mamá, dedeira e
bicos de tetas e bicos de borrachas ela limpa o mundo. Entretanto, o
filho do grande fazendeiro William, num dia triste, rachará a cabeça
de Taís, sem mais nem menos. Antes ele ainda passará a mão na
bunda dela. E, logo em seguida, o jovem burguês vai achatar a cabeça
da faxineira com uma barra de ferro e muita brutalidade. Pegará uma
sentença de 06 meses de reclusão. O juiz era amigo de longa data e
comprava o seu fumo das plantações de William, o grande fazendeiro.
[...]
Neste MÊS das MÃES, rendo homenagens a uma grande amiga: a MÃE NANA. Mesmo sendo freira, Mãe Nana é a que teve 140 filhos e determinou o destino de cada um deles logo que os ia parindo e batizando ao som do blues, do samba e do brega, suas paixões musicais de toda uma vida, bem comprida, aliás. Para não se atrapalhar, a Mãe Nana anotou o destino, pois que maternidade é destino, de cada um dos 140 filhos num caderno de contas que desde 2014 venho digitando.
Neste MÊS das MÃES, rendo homenagens a uma grande amiga: a MÃE NANA. Mesmo sendo freira, Mãe Nana é a que teve 140 filhos e determinou o destino de cada um deles logo que os ia parindo e batizando ao som do blues, do samba e do brega, suas paixões musicais de toda uma vida, bem comprida, aliás. Para não se atrapalhar, a Mãe Nana anotou o destino, pois que maternidade é destino, de cada um dos 140 filhos num caderno de contas que desde 2014 venho digitando.
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Qualquer semelhança com a ficção é a mera realidade.
(c. a. albani da silva, o inventor do vento)
(c. a. albani da silva, o inventor do vento)
Obrigado pela referência ao Bairro Alto Cidade Baixa.
ResponderExcluirhttps://bairroaltocidadebaixa.wordpress.com/